terça-feira, 22 de abril de 2008

O regresso do cachorro com lingüiça

O futebol brasileiro está bem, porque cada vez mais se reaproxima da sua essência fundadora: a várzea.

Até algum pouco tempo atrás renegávamos essa gloriosa vocação. O Brasil fez de tudo para se livrar do estigma da pelada. Tentaram expurgar o amadorismo do nosso futebol.

Não conseguiram. Há forças universais, como o vento e o raio, também na sociedade. Impossível domá-las.

É claro que a tentativa de profissionalizar o futebol brasileiro partiu de algum gestor moderno. A esses paladinos da máxima eficiência, lanço a pergunta: que vergonha há em ser incompetente e trapalhão, se ao mesmo tempo for apaixonante e divertido?

O futebol é um brinquedo. Profissionalizá-lo é tão absurdo como profissionalizar a amarelinha, por exemplo.

O Felipão uma vez, comentando o futebol praticado no meio do século, usou o termo "a época em que se amarravam cachorros com lingüiça".

Esses tempos estão de volta.

Gás de pimenta no vestiário, erros absurdos da arbitragem, chulices compartilhadas entre as torcidas, bate-boca de jogadores, apagão no estádio. Só não somos a favor da violência - o resto é todo bem-vindo.

A mais bela demonstração de amadorismo e apego à várzea do fim de semana, no entanto, não foi nenhuma dessas pérolas listadas acima. O que enchou os olhos do amante do futebol cachorro com lingüiça, da pelada sensu stricto, foi a comemoração do Renato Silva no domingo, após marcar, aos 40 do segundo tempo, o gol que levou o Botafogo à final do Carioca.

Renato Silva, o clássico zagueiro brucutu, perseguido pela torcida, execrado pela crítica, grosso e trombador. Ó ironia. Ele nem acreditou que tinha feito o gol.Saiu vibrando como uma criança na várzea, um bebum na pelada do churrasco, um coitado que acorda às cinco da manhã para ir ao trabalho e descobre que é domingo.

Renato Silva, no próximo jogo, volta a ser Renato Silva.

Ele nunca chegará à seleção, não vai revolucionar a posição do zagueiro, nunca terá o nome ovacionada nas arquibancadas.

Mas sua contribuição ao futebol brasileiro é de valor inestimável.

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