segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Drama em preto e branco

O dramalhão encenado pelo Botafogo no domingo é daquelas coisas que fazem o futebol valer a pena: foi ridículo, insólito e emocionante.

E, para a infelicidade dos alvinegros, o gesto, cujo objetivo era jogar água na festa do campeão, virou motivo de chacota no país inteiro.

Mas será que a indignação do Cuca, do Bebeto de Freitas e dos jogadores é justificada? Teria sido o Botafogo surrupiado pela arbitragem?Vejamos:

O juiz tem culpa se o zagueiro resolve despir o Fábio Luciano em plena grande área?

O juiz tem culpa se o Lúcio Flávio, ciente de que já tem um cartão amarelo, desfere, em seu próprio campo de ataque, um pontapé no Juan?

E, finalmente, que parcela de culpa tem o juiz no gol irretocável do Diego Tardelli, esse sim o verdadeiro responsável pela derrota do Botafogo?

Além disso, lembremos que, na confusão após o gol do Íbson, o jogo ficou parado por quatro minutos, mas o juiz deu apenas cinco de acréscimos ao final da partida. Deveria ter dado, no mínimo, nove. Essa postura do árbitro beneficiaria o Botafogo, que tinha um a menos em campo e para quem a disputa por pênaltis já era desejada àquela altura.

Em todo o caso, obrigado, Botafogo, pela dose de fantasia com a qual o mundo do futebol foi brindado no domingo à noite. Essas histórias de intrigas e conspirações, vítimas indefesas e vilões cruéis ficam ainda mais empolgantes quando os atores realmente se esforçam para acreditar nelas.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Entra em campo a Velha Máxima do futebol

Quando eu era pequeno e ouvia de um comentarista a clássica frase "como diz aquela Velha Máxima do futebol...", achava que ele se referia a uma senhora idosa e venerável, titular do gabinete mais importante da FIFA, responsável em formular não as regras técnicas do futebol, mas sim os imperativos filosóficos que regem o esporte.

Para mim, a Velha Máxima do futebol era uma espécie de rainha Elizabeth.

Mais tarde, descobri que existiam várias velhas máximas do futebol, versando sobre os mais diversos aspectos do jogo, e que elas não eram exatamente respeitáveis senhoras de carne e osso, apenas formulações criadas pelas mentes dos cronistas esportivos.

Com o tempo, concluí também que não precisamos desses cronistas para fazer o intermédio entre nós, o público, e as velhas máximas do futebol. Nós mesmos, com um pouquinho de vivência, ficamos aptos a saber exatamente o que elas vão dizer. Por exemplo, para o jogo de hoje entre o Flamengo e o Botafogo, sei que tem uma velha máxima do futebol que está bradando, para quem quiser ouvir: "Em clássico não há favorito! Em clássico não há favorito!"

Desculpe, velha máxima do futebol, mas terei que discordar. O Flamengo tem pelo menos três vantagens sobre o rival deste domingo: entra em campo com o mesmo time da boa campanha do ano passado, enquanto o Botafogo, que perdeu vários atletas importantes de 2007, ainda tem desfalques hoje por causa de contusão; o Flamengo também tem mais opções - e de qualidade - no banco, como Jônatas, Tardelli e Klebérson, além de contar, certamente, com a maioria na arquibancada.

Tudo isso conspira para uma vitória rubro-negra.

Mas, é claro, se o Botafogo faz um gol logo início, se fecha atrás e fica jogando no contra-ataque a partida inteira, a história pode ser diferente. Afinal, futebol é uma caixinha de surpresas, como diria aquela velha - talvez a mais anciã de todas - máxima do futebol.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Gotejam lágrimas no Crepúsculo das Carreiras

Imagine uma sala confortável, ampla, toda mobiliada de confortáveis poltronas e um frigobar. Seus freqüentadores são senhores um pouco acima dos trinta anos, com a barriguinha já começando a se insinuar, reunidos ali para assistir a um bom futebol enquanto petiscam alguma coisa.

Essa é a sala do Crepúsculo das Carreiras. Personalidades como Cafú, Romário e Vampeta são figurinhas fáceis ali. Viola, brincalhão, banca o mordomo.

Dois grandes do esporte brasileiro reservaram essa semana mesmo suas poltronas nesse ambeinte festivo - não sem antes derramarem algumas lágrimas de relutância: foram os casos do Guga e do Ronaldo. Um vencido pelo quadril, o outro pelo joelho. (Como é impotente o homem).

As pessoas, eternamente propensas a fazerem certa confusão, costumam alçar uma personalidade à condição de herói quando ela chega no Crepúsculo das Carreiras. Tenhamos discernimento. Apesar de se tratar de uma sala distinta, é bem possível entrar ali pela porta dos fundos.

A noite em que os filhos de Papai Joel cruzaram armas contra os homens do terrível Coronel Bolognesi

Começou a fase de grupos da Taça Libertadores da América (o torneio de futebol que tem o nome mais bonito, ainda que inapropriado, uma vez que a América a que se refere ainda não foi de fato libertada).

A Libertadores desperta tanto interesse porque é o mais próximo que a humanidade conseguiu chegar de um ponto de intersecção entre os duelos de gladiores da Roma antiga e o futebol contemporâneo - as duas maiores paixões de massa ao longo da história.

Ter mantido a selvageria da arena e, ao mesmo tempo, abolido as mortes. Ter casado a civilização com a barbárie. Esses são os grandes méritos da Libertadores.

Infelizmente, em nenhum momento da noite de hoje Flamengo e Coronel Bolognesi lembraram os grandes embates que fizeram a fama do torneio. O jogo terminou num zero a zero tão modorrento que, mal comparando, foi como se o leão e o gladiador se sentassem no meio da arena e decidissem resolver suas diferenças numa partida de buraco - tem gente que apreciaria, daí o vôlei.

Prefiro acreditar, e vou dormir aferrado a essa convicção, que os filhos de Papai Joel estão guaradando o melhor para domingo.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

O caminho da desordem

Bizarrices à parte, o Campeonato Carioca continua o mais empolgante do Brasil.

E o clássico dos reservas, com tempestade no céu e nas arquibancadas, foi apenas um prelúdio do que vem no final de semana.

Por que existe uma animosidade tão grande entre os defensores do futebol carioca e os do paulista?

Desconfio que nessa oposição estejam sintetizadas todos os dilemas da existência: de um lado, a vida que queremos levar; de outro, a vida que nos obrigamos a levar.

A bagunça, o descompromisso - e, ao mesmo tempo, a graça - do futebol carioca, ofendem o senso de organização da sociedade.

Como fazem com tudo aquilo que põe em dúvida sua conduta de vida, as pessoas preferem debochar do campeonato do Rio.

Melhor seria se admitissem a acachapante verdade que ele traz: a busca pela eficiência pode não coincidir - e, de fato, na grande maioria dos casos, não coincide - com a conquista da felicidade.