domingo, 29 de março de 2009

Bota o Pato

Mantra do momento: "Dunga, bota o Pato". Não consigo entender como é que até agora ele não virou titular da seleção. Jovem de 20 anos, está na sua segunda temporada no Milan, a primeira como titular, e é o artilheiro do time na Série A, com 14 gols. Está a cinco do goleador da competição, que tem 19. Faz gol jogo sim, jogo também, e por isso deixou os consagrados Inzaghi e Shevchenko esquecidos no banco de reservas.

Mas não são só as estatísticas. O Pato é um finalizador único no futebol mundial. Domina todos os segredos do arremate: vai bem de cabeça, chuta forte com as duas pernas, bate de primeira, por cobertura, com efeito. Prova do que eu estou dizendo é o primeiro gol dele pela seleção. Naquele amistoso contra a Irlanda, em que o goleiro rebateu mal a bola e o Pato, com um toque apenas, colocou por cobertura de fora da área. Ali estava escrito: "o rapaz tem faro".

Por algum motivo incompreensível, torcida, treinador e imprensa ainda não veem o Pato como jogador consolidado. Nessas últimas semanas falaram em Keirrison e até numa volta de Ronaldo para a seleção. Como se não tivéssemos um centroavante pronto para 2010. No fundo, acho que pouca gente realmente assiste futebol no Brasil. A maioria opina do nada.

Na cabeça do Dunga deve passar aquele raciocínio: "tenhamos paciência com o garoto, vamos deixá-lo amadurecer". O que o Elano fez na vida que o Pato ainda não tenha conseguido? Ou o Maicon? Ou o Gilberto Silva? A lógica do Dunga, na verdade, é a seguinte: os brucutus são homens de confiança. Já os habilidosos representam um perigo para a autoridade do técnico. Eles são irreverentes e desobedientes demais

Nosso atual camisa nove, o Luís Fabiano, infelizmente já deixou o auge da carreira para trás. E até a Copa ainda leva um ano, o que significa que a decadência pode se acentuar. Já o Adriano, em tese o reserva imediato, não deveria nem ser convocado. Perdeu-se completamente na carreira.

Assim que o jogo de hoje começar, na altitude de Quito, também eu começarei um ritual lá em casa. "Bota o Pato, bota o Pato..." Ele foi o que de melhor apareceu no ataque brasileiro depois do Ronaldo. Não vale a pena ser desperdiçado.

segunda-feira, 9 de março de 2009

O alambrado

Faz um tempo que eu não simpatizo com o Ronaldo, o Fenômeno. Precisamente desde 2003, quando, na minha opinião, ele começou a atrapalhar a seleção brasileira. Já ali tinha se tornado um jogador fora de forma e descompromissado com a própria carreira. Mas mesmo assim permanecia intocável no ataque do time. E o Luís Fabiano, que comia a bola na época, esquecido na reserva. Ronaldo sempre foi protegido da imprensa e dos dirigentes.

Estou longe de achar o Ronaldo um mito do futebol, que é como ele vai entrar para a história. É o típico caso do jogador que tem muito mais marketing do que competência. O que não significa que tenha sido mau centroavante, pelo contrário. Foi acima da média em certos momentos de sua carreira, principalmente nos anos de 96, 97 e 98. Mas nunca teve a genialidade de outros colegas de posição, contemporâneos dele, como o Romário e o Henry. Além disso, o Rivaldo foi mais importante na conquista de 2002 - outro ponto em que a história fará injustiça.

Antipatias à parte, gostei do gol que ele fez contra o Palmeiras. Gostei principalmente da comemoração e da derrubada do alambrado. Quando uma cena dessas aconteceria nos estádios europeus? Ronaldo mostrou que está disposto a, enfim, relaxar jogando futebol. Divertir-se como um garoto na pelada. Desde muito cedo na carreira ele foi cobrado por resultados e por um desempenho sempre impecável. Na copa de 98, por exemplo, não era mais que um adolescente e tinha um país todo pra carregar nas costas. Parece que agora o Ronaldo quer brincar com o esporte. Escolheu o Brasil para essa nova e última fase da carreira.

Sinceramente, se ele conseguir trazer para os jogos o mesmo espírito lúdico que despertou ao comemorar o gol no alambrado, com se estivesse na várzea, ou nos românticos tempos do cachorro com lingüiça, como diria o Felipão, terá dado talvez a sua maior contribuição para a história do nosso futebol. Ronaldo, ainda que involuntariamente, pode reatar o futebol brasileiro com suas raízes: pouco profissionalismo, muita descontração. Torçamos por ele.

domingo, 1 de março de 2009

No futebol e na vida

Um dos clichês mais chatos dos cronistas esportivos metidos a poetas é insistir no futebol como um pequeno universo mágico no qual estão contidos todos os mistérios da existência. Usam sempre aquela frase, "no futebol, como na vida...". Já cansei de ler e ouvir isso por aí. O que esses comentaristas querem é atribuir um ar de grandeza ao trabalho deles. "Eu não falo apenas de futebol, eu falo do universal". Como se escrever "apenas" de futebol fosse pouca coisa.

Mas hoje é dia de dar o braço a torcer e pedir licença aos filósofos da crônica esportiva para usarmos um pouco de sua sabedoria. Porque vendo o jogo do Botafogo contra o Resende, naquele Maracanã emocionante de tão lotado, o que me passou pela cabeça foi o seguinte: no futebol, como na vida, tudo o que as pessoas querem é uma chance para se deixar iludir.

Sabemos muito bem que a final de hoje representa pouquísimo ou quase nada para a história do Botafogo. Um título da Taça Guanabara, atualmente, equivale mais ou menos ao de um torneio de verão, daqueles de tiro curto, que servem só para aquecer os tamborins para o filé mignon da temporada. Ainda se a partida fosse contra um dos grandes rivais, alguma euforia era justificada. Mas do outro lado do campo estava o inexpressivo Resende, um adversário tão fraco que em nada poderia contribuir para tornar o jogo interessante.

Por isso foi surpreendente ver 75 mil botafoguenses cantando no Maracanã. Entendi que, no fundo, o torcedor só quer um motivo, mínimo que seja, para mostrar o orgulho que tem do seu time. Isso é bonito, é como dizer: "eu te amo, mesmo sabendo que seus feitos não valem tanta coisa assim".

Não há dúvida de que os botafoguenses estarão insuportáveis ao longo da semana, comemorando a Taça Guanabara como se tivessem levado a Copa do Mundo. Vai ter gente falando que o time é um dos favoritos para o Brasileiro. Paciência. Alguns deles até sabem que há uma dose de exagero nisso tudo, mas mesmo assim se permitirão viver a fantasia, enquanto ela durar. Pode ser só até o próximo jogo.

Essa foi uma boa lição, ganhei o domingo. Às vezes a gente acha que é ridículo se entregar ao devaneio, que a realidade deve ser encarada com o máximo de rigor e racionalidade. Não surpreende cotidiano ser um fardo para a maioria de nós. Talvez seja hora de nos consentirmos um pouco mais de ilusão. No futebol e na vida.